sexta-feira, 11 de março de 2011

A Grande Sacanagem da Natureza

Já se perguntaram a respeito do amor? Esse sentimento, diriam alguns, arrebatador, que consome o corpo e a alma da gente? Esse sentimento que carece de uma definição precisa, mas que todo mundo diz compreender, sobretudo quando se encontra enlaçado por ele? Já se perguntaram no fundo do seu âmago a razão da existência dele? Ultimamente venho tentando e confesso que as conclusões não são nada daquelas que estamos acostumados a ouvir do senso comum, da boca do povo. Ele não tem nada de bonzinho ou bonitinho, pelo contrário, é algo perverso, cruel, que tende a diminuir o ser humano diante dos outros, sobretudo diante do objeto amado. É a perda da dignidade, da razão. Vocês podem estar se perguntando: mas que tipo de amor é esse de que falo? Na qualidade de filosofante, claro que poderia generalizar e afirmar que se trata de um conceito geral atribuído realmente a tudo aquilo que entendemos como amor, mas reconheço as limitações de abarcar o todo e prefiro apenas me referir ao amor entre os sexos opostos – ou não. Refiro-me àquele amor afetivo, àquele amor que faz o amante se entregar ao objeto amado irrestritamente, cegamente; àquele amor no qual a pessoa lembra seu objeto amado a cada instante; enfim, refiro-me àquele amor que muitos dizem confundir com a paixão. Se, posteriormente, o leitor quiser aplicar essas minhas elucubrações de uma forma geral devo avisá-lo que será por sua conta e risco, mas o que quero aqui falar é sobre essa coisa chamada amor que descrevi anteriormente e que o senso comum muito bem o conceitua, às vezes, de loucura.

Qualquer um que já amou ou sentiu essa atração tão poderosa ou dolorosa pode se identificar muito bem com essas minhas palavras e talvez até concordar comigo: mas o amor não passa na realidade de uma grande sacanagem da natureza para nós, seres humanos ditos “superiores” e racionais, perdermos o controle que imaginamos ser da nossa razão. Analisem comigo essa linha de raciocínio: a pessoa nasce e, segundo a psicanálise, aquela pessoa em que o recém-nascido manifesta seus primeiros contatos afetivos – a mãe – será o depósito de sua primeira relação amorosa. Até aí tudo bem, pois a mãe retribui durante um bom tempo esse sentimento dito puro – salvo alguns “desvios de padrão” que o saber freudiano explica tão bem que chega até assustar. Na pré-adolescência, ainda segundo uma livre interpretação freudiana, o pequeno ser humano sente outra atração, agora de uma forma bem diferenciada – ou às vezes não –, por outros seres humanos do mesmo sexo; é a fase do “clube do Bolinha” onde “menina não entra” ou do “clube da Luluzinha” onde “menino não entra”; a fase em que o menino ou a menina ainda está em processo de formação e conhecimento de sua identidade sexual. Talvez nessa fase ele ou ela já se depare com as primeiras desilusões amorosas, claro que não se trata aqui de uma desilusão na complexidade de um namoro ou de um casamento, mas sim quando ele ou ela descobre que sua “amizade” (amor) pelo seu amiguinho ou amiguinha não teve o devido retorno que ele ou ela estava acostumado quando do da mãe.

É aquele momento no qual ele ou ela descobre que o amiguinho ou a amiguinha não lhe é “fiel” para todo o sempre. Ele ou ela sente ciúmes ao ver seu amiguinho ou amiguinha brincando com outro ou outra, dando mais atenção a outro ou outra e por aí vai. Quando essas crianças alcançam a adolescência, as coisas complicam um pouco mais. Os hormônios fervilham de um modo que o menino ou a menina atravessam por mudanças drásticas. Será neste momento que a natureza vai iniciar os primeiros testes efetivos da “grande sacanagem” que havia dito anteriormente. Se o garoto ou a garota forem de acordo com os padrões de beleza convencionais, o relacionamento e consequentemente o sexo nessa fase não poderão ser um grande problema, mas, caso estejam fora dos padrões de beleza, poderão surgir várias complicações nessa fase e que, o que é pior, poderão refletir para o resto de suas vidas.

A natureza aumenta os seios e as nádegas da menina, afina sua cintura e alarga o quadril, torna-a mais atraente para o sexo oposto, ela não nutre mais interesse em brincar de boneca e aquele determinado garoto lhe tira do sério, pois ele a faz pensar coisas que ela jamais pensara; ela quer estar com ele, abraçá-lo, beijá-lo, ter relações... É a natureza dizendo a esta menina que ela precisa de um macho para acasalar, mas como somos tidos como “seres superiores” ou dotados de uma capacidade racional estupenda, preferimos chamar isso de “amor”, ou melhor, talvez, de “paixão”. Mas ainda que nos entreguemos a esta coisa, subsiste algo – a razão – tentando explicar o contrário, tentando nos dizer que podemos ter o controle – pura ilusão! – sobre a situação de estar apaixonado. Mas o desejo, o querer estar com o outro é muito mais forte. Talvez seja este fato de chamarmos a atração sexual de paixão ou de amor que nos torna diferentes dos animais porque nós não copulamos como os animais ou nós não devemos fornicar como os animais já que somos “superiores”, dotados de razão.

A natureza também causa transformações no garoto. Aumenta-lhe o tamanho dos membros, dos músculos, engrossa-lhe a voz, faz-lhe crescer pelos por todos os lados do seu corpo... É a natureza sacaneando o outro sexo. Mostrando pra gente que não somos superiores coisa nenhuma; mostrando pra gente que esse negócio de achar que a razão é superiora é pura balela. Então ela, a natureza, essa coisa extremamente poderosa além de fantástica, impõe a esta criatura que se diz “superiora” mais uma evidência de que por mais que a pessoa tente negar, ela o reafirma. O desejo também é forte no homem. Deixa o menino enlouquecido obrigando-o a buscar as válvulas de escape culturais permitidas ao rapazinho: idas e mais idas às casas que vendem sexo (se for de uma família suficientemente abastada), descontar sua frustração ou conquista em uma garota (dependendo da beleza física apresentada por ele) ou simplesmente recorrer à antiga forma de autoajuda sexual e solitária.

Sem dúvida isto tem relação com a Vontade, conceito criado pelo filósofo alemão Arthur Schopenhauer, no qual nos fala dessa potência inconsciente presente naquilo que emana vida e que está espalhada por toda natureza em todos os seres vivos – inclusive nós, por mais que tentem nos diferenciar. Então esse negócio de amor, de paixão, não passa na realidade da vontade natural presente em todos os seres de procriar ou de copular que tentamos desesperadamente disfarçar com adornos desnecessários além de ilusórios. É a natureza que, mesmo sabendo que o ser humano acredita ser “superior” a ela, mostra-lhe inconscientemente sua incapacidade diante dessa coisa tão poderosa chamada instinto. Posso fazer mil cursos superiores, ter títulos e mais títulos, mas diante de situações que minha razão não espera, por exemplo, serão meus instintos que entrarão em ação e tomarão o controle do meu corpo e, talvez o que seja pior, vou imaginar que estou no controle criando discursos e mais discursos para me convencer que eu, este ser racional, está no controle.

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