sábado, 24 de setembro de 2011

E o tempo passou

Tenho que admitir algumas verdades que são tão evidentes quanto a morte que nos aguarda. Verdades estas que nos levam a concluir de forma tão peremptória algo que achávamos já superado: sou um indivíduo solitário. Sobretudo depois que acreditei ser melhor morar em outra cidade que, embora pequena e limitada se comparada à capital sergipense, é aconchegante. Claro que sempre suspeitei de minha tendência para a solidão, no entanto, a existência de pessoas que compartilhavam desse meu ponto de vista a respeito da solidão - meus amigos - ajudavam-me a compreender e a lidar com ela de um modo frutífero.

Sou forçado a admitir, por exemplo, que não sou mais aquele cara de vinte e poucos anos preocupado em ter um emprego “decente”, como dizia constantemente, ao lado de pessoas que sentia prazer ao estarem próximos de mim e compartilharem dos mesmos problemas. Tenho que admitir que os amigos de outrora não mais gozam dos mesmos desejos, dos mesmos sonhos, dos mesmos problemas...

Talvez a beleza da vida esteja nesse reconhecimento muitas vezes tardio de que a vida é esse eterno movimento, essa mudança constante. É essa a condição do ser humano na história. Ontem me via um jovem cheio de expectativas vendendo insegurança, hoje me sinto vazio de expectativas e possuo uma segurança que desconfio se ela me satisfaz de fato. Lembro-me que até os amores eram diferentes, puros, cegos... Hoje até me questiono se o amor existe mesmo ou se é um artifício da natureza para unir esse ser - o humano - que se acha superior aos animais no intuito de manter a espécie.

Estou apenas comparando os momentos com certo ar de amadurecimento ou distanciamento para enxergar melhor o que foi ou o que eles representaram na minha vida. Claro que cada momento possui sua especificidade, sua maneira única de ser, de mostrar-se... Mas que dá uma certa saudade isso sim eu não posso me dar ao luxo de negar.

Também me questiono se tal percepção é um mero reflexo de minha cultura ocidental que tendencia meus pensamentos, meus sentimentos, meu jeito de ser, minha personalidade, enfim, minha vida. Dizer que sou livre dessas interferências talvez seja uma pretensão vã, ilusória. Até que ponto poderia realmente afirmar com todas as letras que sou incólume às influências de uma moda, de uma tendência, de uma ideologia ou ainda de uma saudade?

Hoje meus companheiros são outros sim - se é que posso chamá-los de companheiros de verdade como os de outrora não possuo essa certeza -, mas algo reconheço e admito: esses ditos companheiros de hoje não são mais aqueles de toda hora, de todo momento, dos mesmos desejos, quereres e sonhos. Sentar à frente da casa de minha mãe e definir o que iríamos fazer era uma praxe sagrada. Às vezes faltava um ou outro, mas aí tratávamos de buscá-lo onde quer que estivesse para completar os aventureiros da noite ou a denominação que a gente achava até então adequada, “Os Kerouac’s”, numa óbvia alusão ao On The Road desse autor conhecido dos anos setenta. Detalhe: apenas um de nós de fato lera o tal romance e nos contara os momentos que achávamos ter tudo a ver com nossos espíritos, com nossos "princípios". Nosso objetivo era claro: diversão para o espírito. Conhecer nossa cidade através de duas rodas (bicicletas, não motos) era uma consequência dessa busca; conversar sobre tudo e todos também; viver era a regra geral.

Hoje nosso nome de grupo não soa com tanta força como antigamente, e chega a ser até meio engraçado tentar resgatar aqueles momentos que jamais se repetirão. Pergunto-me até se seria desespero de nossa parte ousar tal façanha, ou melhor, se teríamos realmente esse direito de fazê-lo.

Agora, queridos companheiros, é tentar enxergar à nossa frente – como fazíamos naquela época – e buscar novas “aventuras”, novos desejos, reconhecendo que nosso passado foi algo maravilhoso além de proveitoso e que nos serve como alicerce para aquilo que nos tornamos hoje..


Meu irmão Mário (cod-nome Pi, "membro honorário"), Jhonny (irmão de Tony e mascote) e eu, nos idos anos 90.
Tony, eu, Marcos Aurélio (popular Wacko) e Sidney (popular Magal), a formação original dos Kerouac's.
Tony, Marcos e André, outro "membro honorário".

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Por que adquirir um produto "pirata"?

Embora alguns intelectuais e teóricos de hoje negarem ou até condenarem as críticas ao capitalismo inauguradas principalmente pelo velho Marx quando da sua obra máxima O Capital, alegando uma defasagem no mínimo suspeita, acredito que existam certos aspectos que seriam praticamente inevitáveis não relacioná-los à filosofia marxista, sobretudo sua crítica, ao que, no dizer atualizado dos frankfurtianos, podemos denominar de um “capitalismo tardio”.

Não posso deixar de assumir que os ideais de comunismo proposto por Marx de fato não conseguiram germinar de uma forma tão plena ou então saudável nos moldes do seu pensamento, aliás, como muitos teóricos até concordariam, no entanto, reconhecendo essa “derrota prática” do comunismo marxista, ao menos sua crítica parece de fato ter bastante fundamento e ainda hoje nos servir como alicerce para identificarmos e originarmos uma compreensão mais coerente acerca do problema em questão.

É certo que, para Marx, numa interpretação completamente despretensiosa, na qualidade de filosofante, o próprio capitalismo traria dentro de si elementos que posteriormente o derrocaria. É o princípio dialético inaugurado pelo mestre de Marx, o filósofo também alemão, Hegel, segundo o qual a contradição seria a mola mestra, a engrenagem maior e responsável por mover toda a máquina chamada “modo de produção capitalista”.

Essa contradição estaria, por exemplo, sendo retratada nas relações de trabalho em que o patrão depende do empregado, o explorador do explorado e vice-versa, criando uma relação fundamental entre os opostos, oposição esta típica do capitalismo.

Numa visão mais ampla, ainda seguindo o viés marxista, o próprio capitalismo, à medida que dá sinais de avanço, de progresso, no bojo desse mesmo movimento estaria seu inverso, o atraso, o retrocesso. No capitalismo, existe essa ilusão de que o progresso é necessário, que é importante, ficando subjacente os elementos que irão consumir esse mesmo progresso, esse mesmo avanço. É como se dentro do próprio capitalismo já germinasse um novo modo de produção que o suprimiria. É o que percebemos hoje, por exemplo, no conflito existente entre os grandes donos de empresas contra o comércio dito “pirata”, principalmente nos produtos que estão relacionados à área de informática e que dependem, portanto, da utilização de algum computador.

Acredito que as facilidades ocasionadas pelo advento do computador foram até certo momento esperadas pelos grandes fabricantes desse instrumento com bastante entusiasmo, não obstante, talvez eles não tenham previsto aquilo que o velho Marx já nos mostrara que é justamente essa forma dialética de funcionamento que o capitalismo traz consigo. Do mesmo jeito que ele, o capitalismo, oferece as mil e uma facilidades para sua manutenção, simultaneamente também traz consigo os elementos que poderão enfraquecê-lo e assim suprimi-lo (no sentido da aufheben hegeliana).

Enquanto ouvimos campanhas e mais campanhas para não adquirirmos produtos piratas, produtos esses que seriam frutos do “crime organizado”, de acordo com a descrição dada pelas grandes empresas que estariam inseridas no mercado denominado por eles de “legalizado”, mesmo assim, são eles, os ditos ilegais, que vendem de maneira significativa além de possuírem uma acessibilidade imensa para uma boa parte população e em qualquer lugar do país!

Imaginem que em uma feira municipal, que acontece semanalmente em qualquer cidadezinha do interior de Sergipe, existem bancas que comercializam desde CD’s de músicas, de jogos para vídeo-game, DVD’s de filmes, arquivos em MP3, JPEG, AVI e até, pasmem, programas para computador “hackeados” ou “copiados ilegalmente”. Isto sem comentar na variedade que é imensa e bem maior que as lojas ditas especializadas e que vendem esses produtos em alguns lugares da capital.

Agora pergunto: será que alguém que more no interior de Sergipe iria ser levado a adquirir um “produto original” viajando para a capital, trocando sua própria cidade, sua feira e perder a comodidade de comprá-lo ao lado de sua casa? Acho meio improvável senão impossível. Não possuo a certeza no assunto, mas da mesma forma que uma fábrica que diz empregar dezenas ou centenas de trabalhadores “legalizados”, as fábricas “ilegais” de produtos “piratas” deve contratar do mesmo jeito, óbvio que na clandestinidade e com menos privilégios trabalhistas, mas, ainda assim, estaria empregando do mesmo jeito que as outras fábricas.

SOBRE A RELAÇÃO ENTRE IDEOLOGIA E LINGUAGEM

https://novaescola.org.br/conteudo/1621/mikhail-bakhtin-o-filosofo-do-dialogo Ao me deparar com uma situação relativamente corriqueira em me...