A título de uma explicação mais clara, faz-se necessário de início buscarmos uma definição ou ainda uma espécie de diferenciação acerca do tema deste artigo aqui proposto. É senso comum, por exemplo, acreditar que gênero e sexo são terminologias que gozam de determinada semelhança, não obstante, existem distinções singulares que através de uma observação mais acurada se tornam mais evidentes, sobretudo através de um viés antropológico ou ainda sociológico – nas ciências humanas em geral. Na perspectiva das ciências humanas, tratar de gênero pressupõe uma tentativa de identificar de que maneira se manifestam os aspectos culturais que são de algum modo essencial tanto no sexo masculino quanto no feminino. O que viria a ser propriamente a feminilidade ou a masculinidade naquilo que fisicamente o sexo "mostra" como homem ou mulher, mas que a sociedade influencia de algum modo transformando essa definição física em um conceito sociológico de papel social? Ou seja, será que o sexo é realmente definido por uma condição genética ou uma condição que é dada pela formação social do indivíduo que percebe justamente nessa formação a definição se este mesmo indivíduo será homem ou mulher – isso se partirmos para uma compreensão simplista sem nos envolvermos com as demais variantes contemporâneas que partem da homossexualidade ou da bissexualidade?
De fato, a sociedade atual tem sido cada vez mais maleável ou tolerável no sentido de respeitar as opções de cada indivíduo naquilo que envolve o papel social que o indivíduo está predisposto a escolher. Atualmente as minorias gozam de certo espaço na sociedade para se manifestarem além de, ainda que de modo incipiente, conseguir espaços onde antigamente jamais se pensava estarem, como leis que buscam proteger as mulheres em relação à violência doméstica ou o preconceito que ainda sofrem apesar da criação dessas leis que reconheçam seus direitos. As sociedades ocidentais, de um modo geral, têm permitido que segmentos outrora subsumidos ou reprimidos, ao menos, consigam manifestar algum sinal de insatisfação ou de existência. Se um indivíduo nasce com o sexo masculino, isto é natural, mas se durante sua vida social "escolhe" tornar-se homossexual ou bissexual, isto é cultural, e será neste espaço que a antropologia ou a sociologia tendem a contribuir com os seus estudos. Hoje se pode perceber essa tolerância, repito, ainda que incipiente, àqueles que outrora eram no mínimo estranhos e que não podiam sequer demonstrar sua opção à sociedade daquele momento. Exemplo disso são os movimentos que as minorias vêm construindo com uma participação quase que maciça daqueles que outrora não tinham voz. E a partir dessa compreensão de que as liberdades atualmente vêm sendo um pouco mais respeitadas é que se nota que o gênero não passa de uma construção social, de sentido que a sociedade impõe ao indivíduo e que o indivíduo retorna ou bem ou mal ao seu modo. De acordo com o sentido de gênero, o que torna um indivíduo masculino ou feminino – ou seus desdobramentos – é o tipo de comportamento que esse mesmo indivíduo terá diante dos seus pares, comportamento este notadamente e de algum modo obtido a partir das circunstâncias sociais ou culturais ao qual ele está inserido.
Decerto que nas sociedades ocidentais, sobretudo na América Latina, o papel social dado ao homem obteve um caráter extremamente superior em comparação ao da mulher. O gênero feminino ao longo da história tem sentido o quão de marginalidade, de inferioridade o gênero masculino vem-lhe impondo. Apesar das conquistas localizadas em termos de liberdades, elas ainda sofrem com algum tipo de preconceito social. Contudo, podemos questionar se tal postura é uma exclusividade dos tempos recentes. Se a forma de pensarmos atualmente é influenciada pela cultura helênica e, conseqüentemente, tendo certos reflexos também do cristianismo, por fazermos parte de um mundo que envolve tais prerrogativas que reduziam sobremaneira o papel feminino, então na contemporaneidade conseguimos pelo menos identificar o foco do problema e assim tentarmos partir para as tentativas de solucioná-lo. Claro que ainda há muito por se fazer, sobretudo no que diz respeito às opções que a cultura oferece, entretanto, algumas conquistas aparentemente inócuas serviram e ainda servem como alavanca para conquistas mais contundentes e isso, obviamente, não se aplica exclusivamente ao gênero feminino, aplica-se também aos homossexuais, aos negros, aos índios, etc.