Durante este período de greve dos professores da rede estadual aqui no estado de Sergipe pude perceber mais claramente uma prática recorrente que já vem acontecendo há muito tempo entre os governantes desse estado nos anos pós ditadura: a utilização do poder judiciário como ferramenta de controle da legitimidade ou legalidade das paralisações ou greves.
Chega a ser algo assustador para não dizer extremamente preocupante o fato de na maioria das greves os governantes se utilizarem de recursos jurídicos, do poder da justiça para combater a principal ferramenta da classe operária que é a greve. Como já comentei em um texto anterior a respeito da legitimidade da greve sobre a perspectiva marxista, e aqui não há como fugir também dessa perspectiva, até porque é um dos poucos autores ou pensadores voltado realmente para a realidade dos trabalhadores, a nossa justiça não consegue obter esta mesma capacidade de observar a realidade dos trabalhadores pela ótica dos próprios trabalhadores, mas sim do "povo", da "sociedade", enfim, de conceitos abstratos - diria até vagos - que de alguma forma coadunam misteriosamente com a visão dos patrões, dirigentes ou empresários.
O discurso de justificativa de algum recurso jurídico lançado contra a greve é o de que os trabalhadores não podem prejudicar a população em detrimento de uns poucos. Ora, mas e o oposto? Quer dizer que o sacrifício feito por uma classe operária sempre será aceito porque ela não faz mais que sua obrigação, mas quando os trabalhadores desta mesma classe se unem para reivindicar seus direitos e tentar melhorar suas condições de trabalho aí inventa-se essa coisa de que a maioria não pode sofrer por uma minoria?
Outro aspecto bastante visível para este filosofante corresponde ao caráter sagrado, mágico, encantatório que a justiça possui quando suas decisões são tomadas por absoluto e não levam em conta a realidade dos trabalhadores. Chega a ser no mínimo algo estranho quando os governantes se valem das leis para não legitimar os movimentos grevistas. Agora pergunto: como acreditar que um desembargador ou juiz, muitas vezes nomeado ou indicado, apesar de concursos escusos, por um governador que vá agir de encontro ao seu padrinho político? Como esperar que uma instituição que se vale de aparências como togas ou paletós, repletas de rituais de caráter religiosos - como todos terem que se levantar porque o juiz entrou, quando são exigidas "roupas apropriadas" para simplesmente entrar no fórum ou quando ninguém pode dirigir a palavra ao juiz senão através de um representante, no caso, um advogado - representar um trabalhador, representar alguém do povo?
As leis é que devem ser tratadas como sagradas, não aqueles que as fazem ou ainda aqueles que vivem delas, como os juízes e advogados. Parece que eles não conseguem diferenciar-se e crêem nitidamente que ao lidarem com elas, com as leis, também são efetivamente sagrados, intocáveis, donos absolutos da verdade, principalmente se essa verdade for do interesse daquele que dispor de um maior poder financeiro. Aquele que critica - como eu - corre o risco de, ao ter denunciado a postura de soberba de muitos "homens da lei", ser rechaçado ou sofrer um processo pelo suposto desrespeito aos magistrados, aos arautos "sagrados" da lei porque eles se acham acima de qualquer suspeita. Pior que isso é eles conseguirem convencer as pessoas de que são de fato seres especiais, acima de qualquer um.
Estamos cansados de saber o quão manipulável é o povo. Essa ideia de que possa existir uma "opinião pública" já sabemos que não passa de uma ideologia apregoada pelos donos do poder que possuem as ferramentas necessárias para a dominação do povo, a começar, evidentemente, pela mídia. Aliás, a mídia sempre foi uma grande aliada ou serva das classes mais abastadas. Muito dificilmente, pelo menos aqui em Sergipe, houve uma tevê ou rádio que atingisse a grande massa e que por sua vez estivesse de fato ao lado dos trabalhadores ou da classe operária. Sempre com a ideia de que "a greve prejudica a população", todas as vezes que se noticia uma greve esta ideia é empurrada goela abaixo sem a devida profundidade e com tanta frequência que até consegue dividir a própria classe operária e, pior, colocando a população contra os grevistas, muitas vezes entendidos como marginais, vagabundos, criminosos - talvez um ranço da ditadura militar brasileira.
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