Ao participar de palestras motivacionais que ocorrem rotineiramente na educação do estado de Sergipe, estrategicamente planejadas para antes do início do período letivo, sou sempre tomado de questionamentos, frustrações e indignações que de algum modo me afetam diretamente. Não sei se em outros estados as secretarias de educação agem da mesma forma, de colocar palestras de cunho "motivacionais" aos professores para que iniciem de uma forma bastante positiva o período letivo. Nos meus tempos idos de estudante repleto de ideias e nenhuma prática, com nenhum conhecimento tácito da realidade educacional do meu estado, acreditava piamente que esse tipo de mecanismo pudesse refletir positivamente na educação de alguma maneira. Mas hoje, já passado alguns anos de experiência em sala de aula, não vejo mais com aqueles olhos de outrora. Assumi desde então que não mais participarei desse tipo de evento por justamente desacreditar isso que comumente chamam de "motivação" mas que para mim não passa de "auto-ajuda" retirado dessas palestras motivacionais dadas às empresas.
Geralmente, o indivíduo palestrante se configura como um "enviado especial" da secretaria de educação e que esta, por sua vez, está demonstrando um aceno de preocupação ao dar sua pequena parcela de "motivação" para que justamente esqueçamos das nossas precárias condições de trabalho e tentemos, a todo custo, buscar subterfúgios para continuar a lecionar tal qual a imagem romântica do professor dedicado à educação. É bom que fique bem claro: sou professor, gosto da profissão que escolhi, mas não concordo com as condições de trabalho das quais disponho.
Os palestrantes, assim pude perceber durante minha incursão na rede estadual de ensino até os dias de hoje, geralmente demonstram ser uma pessoa deísta e de preferência católica ou mística e que surge com certo ar de superioridade, com certo ar de pseudo-sapiência e com frases clichês do tipo "estou aqui para aprender com vocês" tão enojante que chega a dar ânsia de vômito! Isso sem comentar a postura de pseudo-profetas crentes de que estão anunciando a grande boa-nova da educação com suas práticas pedagógicas infantis, constrangedoras e sem nenhuma referência a algum teórico ou pensador efetivamente válido ou pelo menos científico da área da educação. Em alguns momentos parecem até tratar os professores como crianças!
Tirando esse aspecto extremamente meloso, de uma religiosidade tosca, de auto-ajuda, retirada desses livros baratos comprados em qualquer grande loja de departamento, os palestrantes ainda se julgam grandes sabedores e "sensitivos" da realidade humana realizando o que para mim é o mais hediondo: propagam a nós, ansiosos professores, saudosos de suas férias, que "nós somos os responsáveis pela situação à qual nos encontramos", "nós somos os responsáveis pela felicidade que queremos", que "o desejo que nós manifestamos para nós reflete no nosso modo de educar"... Em suma, o que eles querem de fato nos informar é que a educação se encontra no estágio que está por nossa culpa! Em nenhum momento aparece uma possível divisão de culpa, pelo menos, ou uma completa acusação de que a esfera política ou os políticos de fato possuem sua contribuição para a má qualidade da educação sergipana! Ou até mesmo a brasileira!
Mais uma vez, reforço, parece que o "enviado divino" - da secretaria da educação ou até, vejam vocês, convidados pela equipe gestora da escola - quer nos confundir, quer convencer a nós professores - e às vezes desconfio se conseguiram de fato - que nós, apenas nós, os "educadores para a vida", somos os únicos responsáveis pela desgraça que assola nossa educação refletida nos índices educacionais extremamente preocupantes.
Pior que isso é quando, ainda por cima, com atitudes no mínimo questionáveis, a secretaria de educação cria suas fórmulas compradas de algum sabichão da educação - que por um azar do destino, nunca sujou as mãos com um giz em sala de aula em uma escola pública - tentando, mais uma vez, colocar a completa responsabilidade da educação sobre as calejadas costas do professor. Esquecem-se que educação não se aprende só na escola. É um papel atribuído também às famílias, às religiões, à política, à sociedade de um modo geral. Concordo sim que cabe a escola ou ao professor uma parcela considerável, mas ele, o professor, sozinho, não pode resolver essa sua parcela se não lhe derem as condições favoráveis para que seu trabalho seja efetivamente desenvolvido.
Não adianta a secretaria - ou as secretarias - de educação enviarem seus "mensageiros" ou seus "místicos milagreiros" para empurrarem suas explicações ou ponderações absurdas, sem relação com a realidade efetiva da escola ou da educação como um todo, aos professores nos inícios dos períodos letivos sem dar aos professores essas condições pelo menos mínimas, a começar por um salário digno que desobrigue o professor de procurar manter-se através de outros vínculos e assim desgastar-se física e mentalmente! Esse "mensageiro" passa a ficar então preso ao que comumente acontecia nos debates entre os doutores da Igreja na Idade Média conhecido como flatus vocis. Os professores aparentam ouvir atentos, que vão colocar em prática aquilo que viram, saem da sala de "debates místicos" "motivados", mas, nas primeiras semanas, estão de volta à dura e triste realidade da sala de aula da escola pública: a escola sem uma estrutura adequada, salários desmotivadores, salas de aula com excesso de alunos, alunos também desmotivados e equipes gestoras atabalhoadas tentando milagrosamente solucionar os índices de reprovação e de abandono como também a "fantasmagórica" presença das interferências políticas nos destinos da escola, sobretudo no que tange àqueles que, não por mérito, mas por uma indicação política têm que segurar as rédeas de uma escola que caminha para a perda de seu valor institucional.
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