Certa ocasião, conversando com um amigo sobre filosofia e coisas afins, deparamo-nos com um questionamento a respeito do que vem a ser necessariamente o ateísmo, sobretudo nos dias de hoje, com um significativo retorno da religiosidade e de religiões inclusive distintas das religiões cristãs de outros momentos históricos.
Conversávamos a respeito de uma reunião que aconteceria em Aracaju dos ateus do nosso estado - e que, confesso, achei deveras esquisito essa "congregação de ateus" - iniciado nas redes sociais via Internet. Quando estava na qualidade de membro virtual desse grupo social de ateus, achei interessante pelo menos saber das opiniões que convergiam dentro dele assim como achei ser interessante também saber se as opiniões que circulavam eram as mesmas ou semelhantes às minhas e, sobretudo e obviamente, meu objetivo maior era o de compartilhar um pouco da angústia de viver em um país notadamente influenciado pela religião, sobretudo a católica, sendo um crítico ferrenho dela.
Como afirmei antes, gostei de participar do grupo até o momento em que um dos coordenadores do grupo passou a insistir para que todos os membros virtuais se encontrassem no "mundo real", numa "reunião" de ateus e agnósticos... Pronto. Isso me soou muito estranho, para não dizer preocupante... Reunir ateus e agnósticos? Geralmente um ateu ou um agnóstico possui uma autonomia intelectual e, historicamente, sabemos das dificuldades de se reunir pessoas autônomas, independentes intelectualmente, em um só lugar - que o diga o exemplo literário presente em O Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley.
Explicitei ao meu amigo então uma busca para uma melhor compreensão do que vem a ser necessariamente ateu - ou agnóstico, que ainda é uma espécie de ateu em gestação, embora o agnóstico tente negar enfaticamente. O ateu é uma pessoa que não aceita ser manobrada, justamente pelo fato de que possui uma autonomia intelectual, como havia falado anteriormente, e que rejeita qualquer tentativa de congregá-lo, já que congregação lembra religião - talvez a palavra "congregação" tenha sido usada inocentemente pelos coordenadores do evento. Falar em congregação para um ateu o faz lembrar automaticamente em igreja, e isso talvez seja o maior sinal de sua discórdia, de sua desavença com a religião.
O ateu não crê em deus algum, sobretudo nos deuses institucionalizados, que no caso recaem sobre as maiores religiões cristãs, o catolicismo e o protestantismo. No que me recordo das aulas de filosofia da religião e de história, os ateus, em muitos casos, geralmente não eram pessoas que assumiam publicamente justamente por medo da repercussão de sua decisão antirreligiosa em um momento histórico vigorosamente influenciado pela Igreja durante a Idade Média na Europa. Houve sim momentos raros e esparsos na história ocidental, principalmente logo após a derrocada da influência religiosa do catolicismo em que o ateísmo virou moda, mas, justamente por ser moda, as pessoas se declaravam ateias por puro capricho ou por receio de sofrer alguma represália social no grupo de amigos que frequentava - ainda hoje vemos certos comentários jocosos quando alguém afirma ser ateu, entre conhecidos ou amigos, e estes o taxam de "à-toa", não ateu. Não obstante, ser ateu foi e ainda é uma decisão, uma escolha individual, extremamente particular de não acreditar em religião alguma ou em entidade superiora ou sobrenatural - isso apenas na história do ocidente, sobretudo na Europa, que nos serve como base referencial de nossa história.
Falar em ateísmo hoje em dia, sobretudo em público ou até na grande mídia, ainda é um tabu. Muitos famosos, sejam eles atores, produtores, diretores, enfim, personalidades conhecidas nacionalmente, são ateus e receiam bastante em falar sobre suas convicções em qualquer programa de televisão - ao contrário dos que dizem ter sua fé. Óbvio que alguns raros já o fizeram - como o caso do Dr. Drauzio Varella em um programa da TV Câmara ou o arquiteto Oscar Niemeyer que em um programa da TV Cultura assumiu sua postura ateia e comunista -, mas é notório que muitos preferem silenciar suas escolhas justamente por evitar a repercussão de suas afirmações em um país cristão. Contudo, não possuo nenhum conhecimento a respeito de que eles, pelo fato de serem públicos, façam parte de grupos de ateus ou agnósticos, ao contrário, simplesmente possuem suas posturas silenciosamente apenas mostrando-as em canais suficientemente exclusivos.
Não que esteja pretendendo convencer as pessoas de que esses famosos devam ser tomados como referência para aqueles que sofram uma imaturidade intelectual. Pretendo sim mostrar que aos ateus não cabem congregações ou coisas parecidas. Acredito muito mais em uma escola ateia - como acontece em alguns lugares do mundo, sobretudo as encabeçadas por Richard Dawkins - que ponha em sua ideologia uma preocupação respeitosa para com as demais religiões apenas como agrupamentos de pessoas. Para finalizar, gostaria de provocar os deístas ou fiéis religiosos - e por que não os não-religiosos também? - com uma esplendorosa afirmação do pai da psicanálise em sua obra O Mal-estar na Cultura a respeito dessa principal característica ateia, a autonomia intelectual:
"[...] Quanto às necessidades religiosas, parece-me imperioso derivá-las do desamparo infantil e do anseio de presença paterna que ele desperta, tanto mais que esse sentimento não se prolonga simplesmente a partir da vida infantil, mas é conservado de modo duradouro pelo medo das forças superiores do destino [...]".
sábado, 8 de dezembro de 2012
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
O problema da Democracia II
Recentemente atravessamos um período de eleições municipais para elegermos prefeitos e vereadores. Falou-se muito em política, em propostas, em ideias, em conchavos, em disputas, enfim, numa série de ações que muitos do senso comum julgam compreender profundamente. É nesse período de eleições que vemos também os inúmeros “cientistas políticos” surgirem e bradarem seus discursos eivados de fórmulas e sentenças que somente eles compreendem – ou não. São pessoas do povo, pseudocientistas políticos que enumeram suas afirmações de um modo tão preciso, tão convicto que em alguns casos chega até a nos assustar. Mas ainda temos aqueles, também do povo, que torcem avidamente qual um torcedor fanático pelo seu candidato que chega até a taxa-lo, em muitos casos, como o “salvador” da cidade, numa óbvia alusão ao elemento religioso, o que os torna, no entender deste humilde filosofante, ainda mais perigosos.
Na cidade onde resido atualmente, esses senhores, digo, esses “doutores da política” são os responsáveis por compreensões das mais brilhantes e mirabolantes possíveis para explicar a derrota do candidato A, C ou B ou a sua vitória, o que de fato levou a vitória, as razões, os motivos, os erros. Longe de querer realizar isso, mas o que de fato quero propor é o que é que esses pseudocientistas realmente compreendem por política. Frase ouvida frequentemente entre esses doutores da política: “o político A perdeu a eleição em função de não ter gastado muito!”, isto é, por não ter “comprado”, isso mesmo, comprado uma quantidade suficiente de votos e por isso sua derrota...
Infelizmente, apesar de toda campanha, de todo material educativo voltado para compreensão do que vem a ser atos de corrupção, muitas pessoas ainda acreditam que seu voto vale alguma coisa, de preferência algo que possa ser trocado por dinheiro. Decerto que em outros momentos postulei sinteticamente minha opinião a respeito da democracia e que discordava dela em muitos aspectos, no entanto, assumo que com ela ainda assim, apesar dos pesares, é a forma de governo prático menos pior que possa existir, pelo menos no atual contexto, em especial aqui em Nossa Senhora das Dores. Mas, apesar de ter admitido pequenos lampejos positivos, sou forçado ainda mais a desacreditá-la por inteiro.
O que de fato me assustou e consequentemente me levou a essa constatação foi o tom de naturalidade que esse suposto cientista político alegou a respeito da influência que o poder financeiro exerce sobre as eleições políticas bem como a clara relação entre compra de voto de que a política municipal, sobretudo, necessita para manter-se e a vitória de algum candidato. Pior ainda: não é que esse suposto cientista político tem razão ao afirmar isso?! Não lhe serve conceitos e tratados ou obras de renomados autores da política, mas a pura e simples experimentação da sua realidade efetiva e objetivar que “política se ganha com compra de voto!”.
As pessoas daqui parecem já estar acostumadas à ideia de que compra de voto seja algo absolutamente natural na política – tem gente que vem de outras cidades registrar seu título de eleitor em troca de favores ou dinheiro. Um favor, um pequeno gesto de ajuda, uma simples conta de bar paga nos dias que antecedem a eleição já é motivo para comprar o voto de alguém. Não ouso afirmar que todos absolutamente realizam tal prática, mas que uma boa parte dos nossos eleitores, entre eles ricos e pobres, fazem isso, de vender seu voto, isso sim sou forçado a afirmar com todas as letras.
Outra coisa que também me deixou bastante assustado e me fez reafirmar o cuidado que as pessoas de “bom coração” devem ter aos aficionados pelo candidato. Um candidato que é objeto dessa adoração quase religiosa chega a possuir o caráter de “salvador”, de arauto do bem na “eterna luta contra o mal”. “O candidato A é uma pessoa boa, de bom coração, o outro candidato é a encarnação do mau, é de espírito de porco” e por aí vai a afirmação ainda desse pseudocientista político. Já aqui não sou mais obrigado a concordar com ele, pois atribuir bondade ou maldade a alguém é algo absolutamente subjetivo, pessoal e independe de uma visão “correta” de mundo – claro, a não ser que se esteja influenciado fortemente por alguma religião ou por folhetins televisivos, as famosas novelas que adoram criar vilões e que de alguma forma levam os telespectadores a afirmar que “na vida real tem gente assim mesmo”.
Pergunto: será que política está unicamente relacionada a poder econômico? Será que o bom político está intimamente relacionado a sua capacidade de influenciar financeiramente sua campanha e consequentemente seus eleitores? Será que o bom político é aquele que vive ainda do velho clientelismo coronelista? Que vive da troca de favores ou simplesmente da compra absurda de votos? Será que o bom político é aquele que unicamente traz empregos para os seus ou para a cidade onde ficou como prefeito?
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
O problema da democracia
A democracia, é notório para muitos de seus defensores, é uma das melhores formas de governo que o ser humano pode gozar em sua história. Repleta de vantagens, de benesses, é de fato uma das formas de governo mais aprimorada para lidar com o ser humano em sociedade e seus anseios de liberdade. Mas hoje em dia mais se assemelha a um discurso envelhecido manejado pela velha burguesia que tenta impor mais uma vez goela abaixo suas sutis formas de dominação, alienação e controle - aliás, e quando de fato ela deixou de sê-lo? Apesar de ela ser a melhor forma de governo para lidar com o próprio ser humano em coletividade, ainda assim traz consigo algumas mazelas cancerígenas e que muito provavelmente irão demorar para extinguir-se, pelo menos por aqui, nas paragens tupiniquins.
A democracia manifesta como uma de suas mazelas cancerígenas, o que parece até um paradoxo, a diversidade de opiniões. Calma, não estou aqui afirmando que sou contra a diversidade de opiniões, mas por permitir uma diversidade de argumentos, de propostas, de programas, ou seja, de ideias que podem ir de encontro à própria democracia. A democracia é exaltada por muitos principalmente porque permite essa liberdade de expressão que muitas vezes é confundida com liberdade de criticar ela mesma e assim paulatinamente ruir seus princípios conquistados a sangue e suor ao longo da história humana.
O velho Aristóteles nos recordara de que o ser humano é um animal condenado a viver em sociedade, a viver na dependência da política, afinal, essencialmente, política nada mais é do que o saber lidar com a coletividade, numa palavra, lidar com os seres humanos. É através da política que o ser humano consegue criar os caminhos pelos quais pode melhorar sua vida em sociedade. Não obstante, o regime de governo mais adequado ao ser humano, segundo o próprio Aristóteles, não é a democracia.
O grande Platão concordaria até certo ponto com a visão aristotélica ao afirmar também que a democracia, apesar de ideologicamente ser mais envolvida com princípios humanitários, estaria eivada de fragilidades que os mais poderosos sem dúvida saberiam notadamente aproveitar. Por isso ele crer muito mais em uma monarquia esclarecida ou um rei-filósofo que no "governo do povo", povo este que não possui as capacidades adequadas para comandar a si mesmo já que não passou por nenhuma espécie de preparação.
No entanto, apesar dos pesares, sou obrigado a concordar até certo ponto tanto com aqueles que defendem quanto com aqueles que criticam a democracia. Concordo ao afirmar que a democracia de fato é a forma de governo que mais permite ao ser humano efetivar sua subjetividade, sua liberdade; discordo quando percebo certos comportamentos, certas atitudes de indivíduos que se dizem "políticos" dentro da democracia com posturas notadamente antidemocráticas ou ditatoriais, posturas mesquinhas de interesses escusos ou simplesmente a busca clara e evidente pelo poder. Sou forçado ainda a questionar sobre a eficácia da democracia ao analisar esses tipos de comportamentos e ações.
Uma análise de cunho filosófico aponta que política e poder andam de mãos juntas. Não é à-toa a enormidade de candidatos a qualquer cargo político. Todos, embora mostrem seus programas mais maravilhosos possíveis, almejam única e exclusivamente o poder de criar leis, de distribuir dinheiro, de criar cargos ou simplesmente de conquistar um status na sociedade, afinal, qualidade da nossa democracia, até um leiteiro pode se tornar um "notável" político - que fique bem claro que não tenho nada contra leiteiros.
Mas essa nossa democracia é tão eivada de defeitos que constantemente vemos exemplos dos variados "desvios" de conduta dos nossos estimados políticos. A democracia parece ser tão frágil, um mero conceito ideológico, no sentido marxista de fato, que serve apenas para ludibriar o mais "inocente" eleitor, esse ser tão importante durante os meses que antecedem alguma eleição. A democracia não nos ensina a identificar os maus políticos, aliás, o que é ser um mau político? Como definir um bom ou um mau político? Como lidar, por exemplo, com indivíduos que só lembram de seus eleitores justamente no período próximo às eleições? Como lidar com indivíduos que se dizem "políticos" quando assumem perseguir seus adversários confundindo-os, em alguns casos, como inimigos íntimos? Pior ainda, como lidar com indivíduos que se autoproclamam "salvador", que estão numa "luta do bem contra o mal"? Como lidar com "políticos" que se aproveitam da fé ou de alguma religião qualquer para se elegerem como o mais capacitado? Numa palavra, como lidar com candidatos políticos que se auto-intitulam arautos de Deus?
Confesso que, apesar do Tribunal Eleitoral gastar bastante dinheiro em propagandas educativas para que se saiba distinguir o bom do mau político, tal exercício é no mínimo dos mais difíceis senão em vão, pois cada um, na realidade, parece dispor de seus argumentos para definir quem é um bom e um mau político. "Bom é aquele que me tirou daquele hospital ruim e me botou num bom!"; "ruim é aquele que não faz festa pra cidade"; "bom é aquele que pagou minhas contas de energia e água"; "bom é aquele que me levou pra cidade de ambulância quando tava doente"; "ruim é aquele que me negou um colchão pra dormir"; enfim, poderia citar aqui uma série de argumentos ditos pelo povo analisando quem é o bom e quem é o mau político... Mas e o povo? Ah, o povo também possui sua parcela de culpa, aliás, diria até a maior parcela. Porém, é melhor me calar para depois não me taxarem de antidemocrático ou contrário ao povo já que "a voz do povo, é a voz de Deus"...
Imagem retirada do blogue http://historikaos.blogspot.com.br |
A democracia manifesta como uma de suas mazelas cancerígenas, o que parece até um paradoxo, a diversidade de opiniões. Calma, não estou aqui afirmando que sou contra a diversidade de opiniões, mas por permitir uma diversidade de argumentos, de propostas, de programas, ou seja, de ideias que podem ir de encontro à própria democracia. A democracia é exaltada por muitos principalmente porque permite essa liberdade de expressão que muitas vezes é confundida com liberdade de criticar ela mesma e assim paulatinamente ruir seus princípios conquistados a sangue e suor ao longo da história humana.
O velho Aristóteles nos recordara de que o ser humano é um animal condenado a viver em sociedade, a viver na dependência da política, afinal, essencialmente, política nada mais é do que o saber lidar com a coletividade, numa palavra, lidar com os seres humanos. É através da política que o ser humano consegue criar os caminhos pelos quais pode melhorar sua vida em sociedade. Não obstante, o regime de governo mais adequado ao ser humano, segundo o próprio Aristóteles, não é a democracia.
O grande Platão concordaria até certo ponto com a visão aristotélica ao afirmar também que a democracia, apesar de ideologicamente ser mais envolvida com princípios humanitários, estaria eivada de fragilidades que os mais poderosos sem dúvida saberiam notadamente aproveitar. Por isso ele crer muito mais em uma monarquia esclarecida ou um rei-filósofo que no "governo do povo", povo este que não possui as capacidades adequadas para comandar a si mesmo já que não passou por nenhuma espécie de preparação.
No entanto, apesar dos pesares, sou obrigado a concordar até certo ponto tanto com aqueles que defendem quanto com aqueles que criticam a democracia. Concordo ao afirmar que a democracia de fato é a forma de governo que mais permite ao ser humano efetivar sua subjetividade, sua liberdade; discordo quando percebo certos comportamentos, certas atitudes de indivíduos que se dizem "políticos" dentro da democracia com posturas notadamente antidemocráticas ou ditatoriais, posturas mesquinhas de interesses escusos ou simplesmente a busca clara e evidente pelo poder. Sou forçado ainda a questionar sobre a eficácia da democracia ao analisar esses tipos de comportamentos e ações.
Uma análise de cunho filosófico aponta que política e poder andam de mãos juntas. Não é à-toa a enormidade de candidatos a qualquer cargo político. Todos, embora mostrem seus programas mais maravilhosos possíveis, almejam única e exclusivamente o poder de criar leis, de distribuir dinheiro, de criar cargos ou simplesmente de conquistar um status na sociedade, afinal, qualidade da nossa democracia, até um leiteiro pode se tornar um "notável" político - que fique bem claro que não tenho nada contra leiteiros.
Mas essa nossa democracia é tão eivada de defeitos que constantemente vemos exemplos dos variados "desvios" de conduta dos nossos estimados políticos. A democracia parece ser tão frágil, um mero conceito ideológico, no sentido marxista de fato, que serve apenas para ludibriar o mais "inocente" eleitor, esse ser tão importante durante os meses que antecedem alguma eleição. A democracia não nos ensina a identificar os maus políticos, aliás, o que é ser um mau político? Como definir um bom ou um mau político? Como lidar, por exemplo, com indivíduos que só lembram de seus eleitores justamente no período próximo às eleições? Como lidar com indivíduos que se dizem "políticos" quando assumem perseguir seus adversários confundindo-os, em alguns casos, como inimigos íntimos? Pior ainda, como lidar com indivíduos que se autoproclamam "salvador", que estão numa "luta do bem contra o mal"? Como lidar com "políticos" que se aproveitam da fé ou de alguma religião qualquer para se elegerem como o mais capacitado? Numa palavra, como lidar com candidatos políticos que se auto-intitulam arautos de Deus?
Confesso que, apesar do Tribunal Eleitoral gastar bastante dinheiro em propagandas educativas para que se saiba distinguir o bom do mau político, tal exercício é no mínimo dos mais difíceis senão em vão, pois cada um, na realidade, parece dispor de seus argumentos para definir quem é um bom e um mau político. "Bom é aquele que me tirou daquele hospital ruim e me botou num bom!"; "ruim é aquele que não faz festa pra cidade"; "bom é aquele que pagou minhas contas de energia e água"; "bom é aquele que me levou pra cidade de ambulância quando tava doente"; "ruim é aquele que me negou um colchão pra dormir"; enfim, poderia citar aqui uma série de argumentos ditos pelo povo analisando quem é o bom e quem é o mau político... Mas e o povo? Ah, o povo também possui sua parcela de culpa, aliás, diria até a maior parcela. Porém, é melhor me calar para depois não me taxarem de antidemocrático ou contrário ao povo já que "a voz do povo, é a voz de Deus"...
domingo, 12 de agosto de 2012
A solidão nos dias de hoje
Falar em solidão atualmente é quase que tratar de um tabu.
Parece ser um tema tão espinhoso, tão perigoso, tão problemático que preferem
deixar este tema atrelado muito mais a uma doença do que necessariamente a algo
associado exclusivamente ao espírito humano. Parece que falar de solidão
pertence única e exclusivamente a uma área da medicina ligada a doenças
psicossomáticas e que somente estes especialistas possuem o dever ou a
capacidade de falar sobre este assunto. Ora, a solidão é uma necessidade para a
reflexão! O indivíduo consegue refletir sobre sua condição coletiva estando
afastado dela, seja periodicamente, temporariamente ou como quer que seja. O
problema é que alguns taxam esses indivíduos solitários como “depressivos”,
potencialmente “problemáticos” ou até como “protocriminosos”.
Apesar dos avanços dos meios de comunicação, do avanço dos
aparelhos telefônicos, da internet, da tevê, enfim, das mídias em geral, ainda
assim vemos pessoas que se sentem sozinhas, solitárias, reclusas. Vemos pessoas
que também dizem estar sofrendo de algum mal psicológico – “depressão”, a
palavra da moda – por estar muito tempo sozinhas, isoladas do contato social ainda
que estejam constantemente “cutucando” ou trocando scraps via internet. Confessam para alguém que “estão mal” porque
estão sozinhas; estão passando por um momento difícil porque estão sozinhas;
cometem até crimes porque se sentiam muito sozinhas, isoladas, ou até excluídas...
Esse é o preço pago pela busca da individualidade iniciada pelo pensamento
moderno? Será que essas pessoas de fato são culpadas por serem diferentes e se
sentirem tão isoladas a ponto de assumir que a solidão pode ser tratada com antidepressivos?
A sociedade pós-industrial não lida muito bem com esse
estado de espírito tão caro ao ser humano, parece que ela sente um temor ao
imaginar que algum ser humano possa ficar a sós consigo mesmo, com seus
pensamentos, e daí crie a possibilidade de questionar justamente essa sociedade
que não permite ao ser humano viver uma solidão saudável, necessária aos
espíritos que almejam ser de fato livres. Inventa logo que se trata de uma “doença
psicológica” e que a pessoa que sofre desse “mal” deve de imediato seguir a
risca as prescrições de um “doutor” apressado em lhe passar um estimulante ou
um calmante, a depender do caso, obviamente.
O problema é que a sociedade pós-industrial não ensinou a
este mesmo ser humano contemporâneo usufruir dessa coisa tão necessária e cara
ao próprio ser humano que se chama solidão - como também não ensinou ao ser humano saber conviver efetivamente em sociedade, mas esse é outro assunto. Com qual intuito ela ensinaria ao
ser humano estar bem consigo mesmo, sozinho consigo mesmo, independente e
autônomo do mundo consumista que de minuto a minuto lhe bombardeia a mente e os
sentidos para fazer com que este ser humano deixe de ser humano e se torne um consumista,
digo, um consumidor? Será que essa sociedade pós-industrial quer deixar o controle da sociedade nas mãos de pessoas que gozem de uma efetiva capacidade de escolha, de liberdade? Um indivíduo que constantemente sinta a obrigação de
comprar alguma coisa para sanar algo misterioso que grita no fundo de seu âmago
e que parece não calar, insaciável, pedindo simplesmente atenção, mas que essa
sociedade pós-industrial dita moderna diz conhecer tão bem e por isso inventa
coisas – produtos – que, segundo ela, sanariam essa inquietação interior?
Na qualidade de simples filosofante, diria que se trata do
próprio espírito humano suplicando um pouco de tempo para si mesmo, para
refletir sobre sua vida, suas escolhas, suas inquietações, suas reais
necessidades. De que me adianta ter um aparelho de celular de última geração,
que toque músicas, vídeos, que possua uma infinidade de recursos se não consigo
falar para mim mesmo? De que adianta ter um emprego maravilhoso, que me pague
um salário fantástico, que dê todas as garantias ou direitos que é permitido a um
trabalhador se não consigo saber se de fato aquele emprego corresponde aos meus
anseios mais íntimos, ou seja, a minha vocação? Será que devo seguir sempre as
tendências da moda que me obrigam de tempos em tempos a trocar o guarda-roupa compulsivamente?
Será que as coisas, os produtos, os sapatos, as roupas, aquele carro do ano
conseguem realmente me satisfazer enquanto ser humano?
Esses produtos, esse consumismo, esse corre-corre rotineiro,
carros, pessoas, tevê, internet, notícias, esportes, informação,
entretenimento..., enfim, parece que absolutamente tudo que existe nessa sociedade
pós-industrial corresponde a constantes tentativas de saciar aquilo que é aparentemente
insaciável no ser humano: a vontade de ser ele mesmo.
quarta-feira, 6 de junho de 2012
A justiça e os interesses dos donos do poder
Durante este período de greve dos professores da rede estadual aqui no estado de Sergipe pude perceber mais claramente uma prática recorrente que já vem acontecendo há muito tempo entre os governantes desse estado nos anos pós ditadura: a utilização do poder judiciário como ferramenta de controle da legitimidade ou legalidade das paralisações ou greves.
Chega a ser algo assustador para não dizer extremamente preocupante o fato de na maioria das greves os governantes se utilizarem de recursos jurídicos, do poder da justiça para combater a principal ferramenta da classe operária que é a greve. Como já comentei em um texto anterior a respeito da legitimidade da greve sobre a perspectiva marxista, e aqui não há como fugir também dessa perspectiva, até porque é um dos poucos autores ou pensadores voltado realmente para a realidade dos trabalhadores, a nossa justiça não consegue obter esta mesma capacidade de observar a realidade dos trabalhadores pela ótica dos próprios trabalhadores, mas sim do "povo", da "sociedade", enfim, de conceitos abstratos - diria até vagos - que de alguma forma coadunam misteriosamente com a visão dos patrões, dirigentes ou empresários.
O discurso de justificativa de algum recurso jurídico lançado contra a greve é o de que os trabalhadores não podem prejudicar a população em detrimento de uns poucos. Ora, mas e o oposto? Quer dizer que o sacrifício feito por uma classe operária sempre será aceito porque ela não faz mais que sua obrigação, mas quando os trabalhadores desta mesma classe se unem para reivindicar seus direitos e tentar melhorar suas condições de trabalho aí inventa-se essa coisa de que a maioria não pode sofrer por uma minoria?
Outro aspecto bastante visível para este filosofante corresponde ao caráter sagrado, mágico, encantatório que a justiça possui quando suas decisões são tomadas por absoluto e não levam em conta a realidade dos trabalhadores. Chega a ser no mínimo algo estranho quando os governantes se valem das leis para não legitimar os movimentos grevistas. Agora pergunto: como acreditar que um desembargador ou juiz, muitas vezes nomeado ou indicado, apesar de concursos escusos, por um governador que vá agir de encontro ao seu padrinho político? Como esperar que uma instituição que se vale de aparências como togas ou paletós, repletas de rituais de caráter religiosos - como todos terem que se levantar porque o juiz entrou, quando são exigidas "roupas apropriadas" para simplesmente entrar no fórum ou quando ninguém pode dirigir a palavra ao juiz senão através de um representante, no caso, um advogado - representar um trabalhador, representar alguém do povo?
As leis é que devem ser tratadas como sagradas, não aqueles que as fazem ou ainda aqueles que vivem delas, como os juízes e advogados. Parece que eles não conseguem diferenciar-se e crêem nitidamente que ao lidarem com elas, com as leis, também são efetivamente sagrados, intocáveis, donos absolutos da verdade, principalmente se essa verdade for do interesse daquele que dispor de um maior poder financeiro. Aquele que critica - como eu - corre o risco de, ao ter denunciado a postura de soberba de muitos "homens da lei", ser rechaçado ou sofrer um processo pelo suposto desrespeito aos magistrados, aos arautos "sagrados" da lei porque eles se acham acima de qualquer suspeita. Pior que isso é eles conseguirem convencer as pessoas de que são de fato seres especiais, acima de qualquer um.
Estamos cansados de saber o quão manipulável é o povo. Essa ideia de que possa existir uma "opinião pública" já sabemos que não passa de uma ideologia apregoada pelos donos do poder que possuem as ferramentas necessárias para a dominação do povo, a começar, evidentemente, pela mídia. Aliás, a mídia sempre foi uma grande aliada ou serva das classes mais abastadas. Muito dificilmente, pelo menos aqui em Sergipe, houve uma tevê ou rádio que atingisse a grande massa e que por sua vez estivesse de fato ao lado dos trabalhadores ou da classe operária. Sempre com a ideia de que "a greve prejudica a população", todas as vezes que se noticia uma greve esta ideia é empurrada goela abaixo sem a devida profundidade e com tanta frequência que até consegue dividir a própria classe operária e, pior, colocando a população contra os grevistas, muitas vezes entendidos como marginais, vagabundos, criminosos - talvez um ranço da ditadura militar brasileira.
Chega a ser algo assustador para não dizer extremamente preocupante o fato de na maioria das greves os governantes se utilizarem de recursos jurídicos, do poder da justiça para combater a principal ferramenta da classe operária que é a greve. Como já comentei em um texto anterior a respeito da legitimidade da greve sobre a perspectiva marxista, e aqui não há como fugir também dessa perspectiva, até porque é um dos poucos autores ou pensadores voltado realmente para a realidade dos trabalhadores, a nossa justiça não consegue obter esta mesma capacidade de observar a realidade dos trabalhadores pela ótica dos próprios trabalhadores, mas sim do "povo", da "sociedade", enfim, de conceitos abstratos - diria até vagos - que de alguma forma coadunam misteriosamente com a visão dos patrões, dirigentes ou empresários.
O discurso de justificativa de algum recurso jurídico lançado contra a greve é o de que os trabalhadores não podem prejudicar a população em detrimento de uns poucos. Ora, mas e o oposto? Quer dizer que o sacrifício feito por uma classe operária sempre será aceito porque ela não faz mais que sua obrigação, mas quando os trabalhadores desta mesma classe se unem para reivindicar seus direitos e tentar melhorar suas condições de trabalho aí inventa-se essa coisa de que a maioria não pode sofrer por uma minoria?
Outro aspecto bastante visível para este filosofante corresponde ao caráter sagrado, mágico, encantatório que a justiça possui quando suas decisões são tomadas por absoluto e não levam em conta a realidade dos trabalhadores. Chega a ser no mínimo algo estranho quando os governantes se valem das leis para não legitimar os movimentos grevistas. Agora pergunto: como acreditar que um desembargador ou juiz, muitas vezes nomeado ou indicado, apesar de concursos escusos, por um governador que vá agir de encontro ao seu padrinho político? Como esperar que uma instituição que se vale de aparências como togas ou paletós, repletas de rituais de caráter religiosos - como todos terem que se levantar porque o juiz entrou, quando são exigidas "roupas apropriadas" para simplesmente entrar no fórum ou quando ninguém pode dirigir a palavra ao juiz senão através de um representante, no caso, um advogado - representar um trabalhador, representar alguém do povo?
As leis é que devem ser tratadas como sagradas, não aqueles que as fazem ou ainda aqueles que vivem delas, como os juízes e advogados. Parece que eles não conseguem diferenciar-se e crêem nitidamente que ao lidarem com elas, com as leis, também são efetivamente sagrados, intocáveis, donos absolutos da verdade, principalmente se essa verdade for do interesse daquele que dispor de um maior poder financeiro. Aquele que critica - como eu - corre o risco de, ao ter denunciado a postura de soberba de muitos "homens da lei", ser rechaçado ou sofrer um processo pelo suposto desrespeito aos magistrados, aos arautos "sagrados" da lei porque eles se acham acima de qualquer suspeita. Pior que isso é eles conseguirem convencer as pessoas de que são de fato seres especiais, acima de qualquer um.
Estamos cansados de saber o quão manipulável é o povo. Essa ideia de que possa existir uma "opinião pública" já sabemos que não passa de uma ideologia apregoada pelos donos do poder que possuem as ferramentas necessárias para a dominação do povo, a começar, evidentemente, pela mídia. Aliás, a mídia sempre foi uma grande aliada ou serva das classes mais abastadas. Muito dificilmente, pelo menos aqui em Sergipe, houve uma tevê ou rádio que atingisse a grande massa e que por sua vez estivesse de fato ao lado dos trabalhadores ou da classe operária. Sempre com a ideia de que "a greve prejudica a população", todas as vezes que se noticia uma greve esta ideia é empurrada goela abaixo sem a devida profundidade e com tanta frequência que até consegue dividir a própria classe operária e, pior, colocando a população contra os grevistas, muitas vezes entendidos como marginais, vagabundos, criminosos - talvez um ranço da ditadura militar brasileira.
terça-feira, 15 de maio de 2012
A greve como artifício fundamental na sociedade de classes
Ao vivenciar uma greve dos professores da rede estadual pública daqui de Sergipe que está prestes a completar 30 dias, pude perceber através das conversas de alguns populares, em especial de pais que possuem filhos em escolas públicas, uma insatisfação significativa em relação aos professores grevistas. Os professores lutam por uma incorporação do piso nacional da categoria ao salário-base, o que, de acordo com o SINTESE (o sindicato dos professores do estado de Sergipe), seria de 22,22%; o governo atual, do governador Marcelo Déda, diz ser praticamente inviável tal porcentagem e cogita a possibilidade de até 6% de aumento, inclusive para as demais categorias de funcionários do estado. Talvez o mais agravante, na visão do governo e desses pais, seja de fato os quase 30 dias sem aula dos alunos, sobretudo os que pretendem realizar a prova do ENEM que acontece em meados de novembro. Mas na visão dos professores, é diferente.
Ao tomar ciência dessa distorção percentual em que a categoria de professores exige 22,22% e o estado com uma contrapartida bastante inferior de até 6%, os pais desses alunos, aqueles que acreditam que o professor é um dos funcionários mais bem pagos da sociedade porque "vai de carro dar aula", veem nessa distorção uma greve que só tende a prejudicar os seus filhos.
Diante de um contexto social no qual a maioria das pessoas não dispõe de uma aptidão crítica convincente para reclamar e sobretudo tentar transformar as condições pelas quais se encontram - talvez pela influência da religião -, nada mais "natural" do que reclamar daqueles poucos que tentam realizar isso que elas não conseguem. A maioria dessas pessoas é simplesmente incapaz de compreender que vivemos sob o jugo de um Estado que visa as benesses de uma minoria que goza de privilégios e que possui um acesso mais profícuo aos recursos financeiros do nosso país. Em síntese, por mais que se conquistem direitos e mais direitos, existe sempre aquela classe de pessoas que consegue manter-se, consegue ter um padrão de vida bastante diferenciado da maioria da população, na literatura marxista são denominados de burgueses.
Essas pessoas não conseguem entender que o Estado é o catalisador dos conflitos naturais dentro de uma sociedade de classes; não entendem que toda greve dentro dessa sociedade de classes é algo extremamente necessária além, realizando ainda uma interpretação marxista, de natural. Toda sociedade democrática, onde existam classes distintas, o conflito entre essas classes tem que necessariamente existir. Por isso que as greves são essenciais dentro desse contexto . Elas simbolizam o clímax desses conflitos. Não importa se sejam 10, 20 ou 30% de aumento, a greve simboliza um momento em que a classe subalterna está exigindo mais daquilo que ela vem sendo expropriada para assim conseguir manter um padrão de vida menos sofrível.
O Estado na sociedade capitalista representa o interesse da classe que mantém o controle da produção, dos capitalistas, muito embora nas sociedades democráticas a sociedade consiga manter ou criar representantes dos demais segmentos sociais, sobretudo oriundos da classe subalterna, que de alguma maneira conseguem diminuir os impactos das desproporções sociais inerentes a toda sociedade capitalista dividida por classes.
O controle maior se dá efetivamente a partir daqueles que detêm os meios de produção enquanto que a outra parte da sociedade, os que não possuem os recursos financeiros para munir-se dos meios de produção, vendem apenas sua mão de obra, sua força para o trabalho, seu tempo de vida. O médico vende sua mão de obra; o empacotador de um supermercado vende sua força de trabalho; o advogado vende seu tempo de vida. Todos aqueles que possuem um emprego, que dependem de um salário, por isso assalariados, realizam tal permuta por dinheiro, e esse dinheiro alimenta o sistema capitalista e sustenta aqueles poucos privilegiados que não dependem de um salário para sobreviver.
E aí aparece um trabalhador, um vendendor do seu tempo de vida, e critica o seu colega também trabalhador chamando-o de "vagabundo" porque ele conseguiu unir e conscientizar a categoria para reinvindicar seus direitos a uma vida mais digna através de uma greve. Aparece um pai de um filho de uma escola pública causticante de problemas, que está sujeita às mazelas de um Estado desqualificado para lidar com educadores, que desvaloriza esses educadores, e diz que o professor "é um revoltado sem causa".
Ao tomar ciência dessa distorção percentual em que a categoria de professores exige 22,22% e o estado com uma contrapartida bastante inferior de até 6%, os pais desses alunos, aqueles que acreditam que o professor é um dos funcionários mais bem pagos da sociedade porque "vai de carro dar aula", veem nessa distorção uma greve que só tende a prejudicar os seus filhos.
Diante de um contexto social no qual a maioria das pessoas não dispõe de uma aptidão crítica convincente para reclamar e sobretudo tentar transformar as condições pelas quais se encontram - talvez pela influência da religião -, nada mais "natural" do que reclamar daqueles poucos que tentam realizar isso que elas não conseguem. A maioria dessas pessoas é simplesmente incapaz de compreender que vivemos sob o jugo de um Estado que visa as benesses de uma minoria que goza de privilégios e que possui um acesso mais profícuo aos recursos financeiros do nosso país. Em síntese, por mais que se conquistem direitos e mais direitos, existe sempre aquela classe de pessoas que consegue manter-se, consegue ter um padrão de vida bastante diferenciado da maioria da população, na literatura marxista são denominados de burgueses.
Essas pessoas não conseguem entender que o Estado é o catalisador dos conflitos naturais dentro de uma sociedade de classes; não entendem que toda greve dentro dessa sociedade de classes é algo extremamente necessária além, realizando ainda uma interpretação marxista, de natural. Toda sociedade democrática, onde existam classes distintas, o conflito entre essas classes tem que necessariamente existir. Por isso que as greves são essenciais dentro desse contexto . Elas simbolizam o clímax desses conflitos. Não importa se sejam 10, 20 ou 30% de aumento, a greve simboliza um momento em que a classe subalterna está exigindo mais daquilo que ela vem sendo expropriada para assim conseguir manter um padrão de vida menos sofrível.
O Estado na sociedade capitalista representa o interesse da classe que mantém o controle da produção, dos capitalistas, muito embora nas sociedades democráticas a sociedade consiga manter ou criar representantes dos demais segmentos sociais, sobretudo oriundos da classe subalterna, que de alguma maneira conseguem diminuir os impactos das desproporções sociais inerentes a toda sociedade capitalista dividida por classes.
O controle maior se dá efetivamente a partir daqueles que detêm os meios de produção enquanto que a outra parte da sociedade, os que não possuem os recursos financeiros para munir-se dos meios de produção, vendem apenas sua mão de obra, sua força para o trabalho, seu tempo de vida. O médico vende sua mão de obra; o empacotador de um supermercado vende sua força de trabalho; o advogado vende seu tempo de vida. Todos aqueles que possuem um emprego, que dependem de um salário, por isso assalariados, realizam tal permuta por dinheiro, e esse dinheiro alimenta o sistema capitalista e sustenta aqueles poucos privilegiados que não dependem de um salário para sobreviver.
E aí aparece um trabalhador, um vendendor do seu tempo de vida, e critica o seu colega também trabalhador chamando-o de "vagabundo" porque ele conseguiu unir e conscientizar a categoria para reinvindicar seus direitos a uma vida mais digna através de uma greve. Aparece um pai de um filho de uma escola pública causticante de problemas, que está sujeita às mazelas de um Estado desqualificado para lidar com educadores, que desvaloriza esses educadores, e diz que o professor "é um revoltado sem causa".
domingo, 8 de abril de 2012
Ciência versus Religião: um infinito conflito
Dentre os muitos temas polêmicos tratados pela filosofia, existe um que me deixa bastante apreensivo quando vou tratá-lo em sala de aula. O tema é a religião e sua relação com o mito, sobretudo quando da existência da mitologia cristã. Nos manuais de filosofia, pelo menos os que trabalhei e trabalho, parecem notar a mesma apreensão que sinto. Não comentam detidamente ou detalhadamente o tema em questão ou sequer fazem alguma referência à mitologia cristã. Não sei se por um receio inocente ou por puro medo de seu título não ser aceito pelas escolas. Comentam sobre mitologias indígenas daqui ou de regiões distantes e, claro, a grega, mas sem criar qualquer referência à mitologia cristã.
Tomei consciência desse "lapso inocente" ao citar justamente o que os manuais omitiram e, para minha parcial surpresa, alguns alunos questionaram. Primeiro: não conseguiam compreender que a explicação mitológica não é algo meramente fantasioso, mas sim uma tentativa de explicação da realidade relacionada à afetividade humana. Segundo: a dificuldade em distinguir a explicação científica da explicação religiosa-mítica, por exemplo, a respeito da origem do mundo. Por fim: não conseguiam entender também a necessidade do embasamento bibliográfico quando se comenta a respeito de alguma ideia, sobretudo filosófica, em detrimento das suas apresentadas porque o "pastor assim o disse" ou "está na Bíblia"; aliás, falar "está na Bíblia" é quase como que se Deus baixasse e dissesse diretamente a eles, não compreendendo, portanto, que existem tradutores e intérpretes para as várias passagens bíblicas.
O curioso desses "alunos-questionadores" é que todos eles, sem excessão, são de igrejas protestantes e parecem não aceitar outra interpretação ou ideia ainda que alicerçada em documentos ou concepções de teóricos que tentam explicar algo que para eles já está sacramentado porque o "pastor assim o disse"! Dogmáticos radicais, parecem sentir um medo quando alguém aponta uma outra perspectiva distinta daquela da sua igreja ou então crêem ser um discurso disfarçado da religião católica.
Óbvio que inicialmente achei essa atitude deles bastante salutar, afinal sou um professor de filosofia e meu principal objetivo é tornar o aluno capaz de questionar as coisas, porém, notei algum tempo depois que na realidade não passa de uma ilusão de minha parte, porque eles não querem questionar no sentido de problematizar filosoficamente uma ideia ou um conceito; o que eles pretendem realmente é mostrar que estão convictos de suas escolhas religiosas e que, infelizmente, seguem à risca aquilo que o pastor falou.
Um desses alunos supostamente questionadores chegou até a dizer durante uma aula que a teoria do Big Bang era uma "invenção mentirosa para enganar a humanidade" apesar de minhas incansáveis explicações para ele tentando mostrar que tal teoria não é uma "verdade absoluta", mas que, pelo fato de ser científica, possui comprovações além de seguir um discurso lógico; no dia seguinte me trouxe o "livro da verdade", um folheto da sua igreja contendo a "verdadeira explicação" sobre a origem da humanidade e do universo - mitologia cristã.
Uma outra, após algum comentário que fiz a respeito de santo Agostinho sobre sua explicação do conceito da Santíssima Trindade, que teria sido ele o precursor dessa compreensão, que na Bíblia não existia essa explicação de modo claro e objetivo além de filosófico, na semana seguinte alegou que eu estaria faltando com a verdade - pra não me chamar de mentiroso - quando afirmei ser Agostinho o inaugurador dessa explicação, pois o pastor dela lhe disse que "o professor não leu a Bíblia e não entende que ela é fruto da inspiração divina"! Mais uma vez tentei explicá-la das distinções, mas minhas palavras foram em vão, pois sua postura era de total indiferença ao que explicava enquanto ela distraía-se com uma colega e quando se voltava para mim estava com "pedras nas mãos", questionando em voz alta minha explicação e impondo a sua.
Não pretendo com isso perseguir os alunos ou até culpá-los exclusivamente pela postura dogmática e até intransigente de lidar com perspectivas diferentes das deles. Com certeza eles, adolescentes ou crianças ainda em desenvolvimento, são visível e fortemente influenciados pela família rigorosamente religiosa e por mestres religiosos radicalmente dogmáticos que conseguem exercer uma influência tamanha sobre seus espíritos ainda em construção. Não custa nada lembrar que tais posturas muitas vezes levam ao preconceito, ao desrespeito com o outro ou, ainda pior, à intolerância religiosa. Reconheço minha missão enquanto professor de combater esse tipo de comportamento, mas reconheço e admito também minha incapacidade de combater esse mesmo tipo de comportamento quando ele é fecundo na família e na religião. Acredito que por mais que a escola traga consigo essa honrosa missão da educação, ela não é uma exclusividade sua, mas sobretudo da família e por que não da religião também? Afinal, Deus legou seus ensinamentos de amor e harmonia com o próximo apesar de em muitas vezes não percebermos.
Depois dessas experiências entendi a omissão dos manuais e mais uma vez cheguei à mesma conclusão: ainda vivemos - pelo menos aqui nesta cidade - sobre a influência dominadora da religião apesar do avanço da ciência. Meu consolo é que, pelo menos, não tenho o mesmo destino de Giordano Bruno quando questiono e manifesto minha insatisfação com essa presença ainda tão marcante na sociedade onde vivo.
Tomei consciência desse "lapso inocente" ao citar justamente o que os manuais omitiram e, para minha parcial surpresa, alguns alunos questionaram. Primeiro: não conseguiam compreender que a explicação mitológica não é algo meramente fantasioso, mas sim uma tentativa de explicação da realidade relacionada à afetividade humana. Segundo: a dificuldade em distinguir a explicação científica da explicação religiosa-mítica, por exemplo, a respeito da origem do mundo. Por fim: não conseguiam entender também a necessidade do embasamento bibliográfico quando se comenta a respeito de alguma ideia, sobretudo filosófica, em detrimento das suas apresentadas porque o "pastor assim o disse" ou "está na Bíblia"; aliás, falar "está na Bíblia" é quase como que se Deus baixasse e dissesse diretamente a eles, não compreendendo, portanto, que existem tradutores e intérpretes para as várias passagens bíblicas.
O curioso desses "alunos-questionadores" é que todos eles, sem excessão, são de igrejas protestantes e parecem não aceitar outra interpretação ou ideia ainda que alicerçada em documentos ou concepções de teóricos que tentam explicar algo que para eles já está sacramentado porque o "pastor assim o disse"! Dogmáticos radicais, parecem sentir um medo quando alguém aponta uma outra perspectiva distinta daquela da sua igreja ou então crêem ser um discurso disfarçado da religião católica.
Óbvio que inicialmente achei essa atitude deles bastante salutar, afinal sou um professor de filosofia e meu principal objetivo é tornar o aluno capaz de questionar as coisas, porém, notei algum tempo depois que na realidade não passa de uma ilusão de minha parte, porque eles não querem questionar no sentido de problematizar filosoficamente uma ideia ou um conceito; o que eles pretendem realmente é mostrar que estão convictos de suas escolhas religiosas e que, infelizmente, seguem à risca aquilo que o pastor falou.
Um desses alunos supostamente questionadores chegou até a dizer durante uma aula que a teoria do Big Bang era uma "invenção mentirosa para enganar a humanidade" apesar de minhas incansáveis explicações para ele tentando mostrar que tal teoria não é uma "verdade absoluta", mas que, pelo fato de ser científica, possui comprovações além de seguir um discurso lógico; no dia seguinte me trouxe o "livro da verdade", um folheto da sua igreja contendo a "verdadeira explicação" sobre a origem da humanidade e do universo - mitologia cristã.
Uma outra, após algum comentário que fiz a respeito de santo Agostinho sobre sua explicação do conceito da Santíssima Trindade, que teria sido ele o precursor dessa compreensão, que na Bíblia não existia essa explicação de modo claro e objetivo além de filosófico, na semana seguinte alegou que eu estaria faltando com a verdade - pra não me chamar de mentiroso - quando afirmei ser Agostinho o inaugurador dessa explicação, pois o pastor dela lhe disse que "o professor não leu a Bíblia e não entende que ela é fruto da inspiração divina"! Mais uma vez tentei explicá-la das distinções, mas minhas palavras foram em vão, pois sua postura era de total indiferença ao que explicava enquanto ela distraía-se com uma colega e quando se voltava para mim estava com "pedras nas mãos", questionando em voz alta minha explicação e impondo a sua.
Não pretendo com isso perseguir os alunos ou até culpá-los exclusivamente pela postura dogmática e até intransigente de lidar com perspectivas diferentes das deles. Com certeza eles, adolescentes ou crianças ainda em desenvolvimento, são visível e fortemente influenciados pela família rigorosamente religiosa e por mestres religiosos radicalmente dogmáticos que conseguem exercer uma influência tamanha sobre seus espíritos ainda em construção. Não custa nada lembrar que tais posturas muitas vezes levam ao preconceito, ao desrespeito com o outro ou, ainda pior, à intolerância religiosa. Reconheço minha missão enquanto professor de combater esse tipo de comportamento, mas reconheço e admito também minha incapacidade de combater esse mesmo tipo de comportamento quando ele é fecundo na família e na religião. Acredito que por mais que a escola traga consigo essa honrosa missão da educação, ela não é uma exclusividade sua, mas sobretudo da família e por que não da religião também? Afinal, Deus legou seus ensinamentos de amor e harmonia com o próximo apesar de em muitas vezes não percebermos.
Depois dessas experiências entendi a omissão dos manuais e mais uma vez cheguei à mesma conclusão: ainda vivemos - pelo menos aqui nesta cidade - sobre a influência dominadora da religião apesar do avanço da ciência. Meu consolo é que, pelo menos, não tenho o mesmo destino de Giordano Bruno quando questiono e manifesto minha insatisfação com essa presença ainda tão marcante na sociedade onde vivo.
sábado, 10 de março de 2012
Livro: um peso morto para a educação pública
O ano letivo que iniciou trouxe boas novas para os professores de filosofia da rede estadual de Sergipe. Depois de algum tempo de lutas e conflitos junto aos órgãos competentes para o devido reconhecimento e inclusão da citada matéria pelo menos no ensino médio, os responsáveis por essas articulações junto à máquina do Estado enfim foram sensibilizados - principalmente depois da inclusão de conceitos filosóficos no ENEM, aliás, o "santo" ENEM. Lembro-me da época que, em parceria com nobres colegas do curso de filosofia da Universidade Federalde Sergipe, como André, Santa Rosa e Salomão, e de alguns professores como Marcos André, buscávamos através da nossa participação ligeira no nosso Centro Acadêmico (o CAFIL) sensibilizar algumas autoridades do Estado ou da própria UFS para incorporar pelo menos os conteúdos de filosofia no exame do vestibular hoje extinto. As experiências foram boas, mas as conquistas nem tanto.
Passado algum tempo, o estado de Segipe abre concurso e alguns colegas, assim como eu, fizemos e hoje estamos a serviço daquilo que outrora criticávamos constantemente - mas ainda me sinto como uma "contra-mola que resiste" mesmo estando na folha de pagamento do servidor público, pois ainda há muito para se criticar nessa máquina burocrática que é o Estado. Dentro do Estado conseguimos criar então novas perspectivas a respeito da realidade do ensino de filosofia, do impacto dessa matéria nos alunos bem como da sua "importância" em relação às demais matérias. Se bem que ainda vivenciamos uma cultura escolar que busca valorizar sempre matemática e língua portuguesa em relação às outras matérias. Bom, mas isso não vem ao caso nesse momento.
Assim que entramos em sala de aula pudemos vislumbrar uma realidade completamente distinta daquela que estávamos acostumados no nosso curso superior, por exemplo, a aula de filosofia dura 50 minutos; só existe uma aula por semana e uma quantidade de conteúdos que não condiz com o tempo ofertado; os alunos - bem como alguns colegas - desprestigiam a matéria por concordar que nela "todo mundo passa" e que, portanto, ela é "fácil"; reprovar em filosofia ou fazer recuperação para filosofia chega a ser uma afronta aos alunos, quase uma vergonha - certa vez tive que engolir de uma aluna que não aceitava fazer a prova de recuperação só em filosofia já que tinha passado em todas as outras; isso sem comentar a dificuldade de boa parte do alunado em interpretar textos muito menos escrever um simples texto.
É bom deixar claro que acredito que isso não seja uma culpa do nosso aluno, pelo contrário, ele, assim como os professores de filosofia, são vítimas de uma cultura excludente quanto às matérias que exigem um pouco mais de rigor interpretativo assim como de uma ordem prática vigente na nossa sociedade que não aceita matérias que trabalham unicamente com conceitos ou ainda com o abstrato, necessariamente nós, professores de filosofia, somos forçados a convencer nosso aluno de que trabalhar apenas com a crítica, com a desconstrução da realidade seja algo realmente de interesse dele e que tal artifício ajuda-o a viver com um pouco mais de consciência em relação às coisas do mundo. Mas como discutir com um aluno nos moldes filosóficos se ele está costumado a "pensar" com o time da tevê? Bom, mas isso também não vem ao caso nesse momento.
Vamos às boas novas! Diante desse quadro no mínimo desestimulante para o professor de filosofia, eis que uma fagulha de esperança surge: os livros de filosofia para o ensino médio enfim chegaram às nossas salas de aula! Agora sim não me esforçarei mais em fazer aqueles resuminhos buscando mastigar ao máximo os conceitos e aspectos - ufa! que trabalho... - para escrever no quadro durante metade da aula e explicá-lo no restante torcendo para o aluno não ter dúvida e assim tomar mais tempo e atrasar o conteúdo; ou então não precisarei mais criar apostilas "sorteando" os conteúdos que minha percepção acredita ser mais adequada para determinada série deixando outros conteúdos de fora. Sim, agora, finalmente, terei minha rendenção. Bastará chegar à sala de aula e o nosso aluno já estará com o referido livro em mãos pronto para mergulhar no mar do conhecimento...
Agora o aluno do ensino médio dispõe de onze livros, dentre esses onze o de filosofia. Mas eis que uma ducha de água fria cai por sobre a "fagulha de esperança": "Professor?! Não podemos carregar esses livros todos os dias!", diz um aluno revoltado com a entrega dos livros na escola. "Meu querido, você só vai precisar carregar no máximo cinco por dia!", respondi crente de que o dito cujo compreenderia que para o conhecimento livro não tem peso - que lindo... "Ah, professor, dê um jeito porquê eu não sou burro de carga para carregar cinco livros todos os dias para a escola". Fechei os olhos, respirei fundo, pensei uma quantidade de respostas para retribuir, algumas bem escabrosas, mas preferi esta: "Está bem, meu querido, se preferir, não traga nada, é sua a escolha". Contudo, depois de ouvir não só essa mas muitas outras reclamações dos alunos sobre esse peso, eis que, numa reunião de pais e mestres logo em seguida, surge uma mãe transtornada porque o filho dela de treze anos não poderia carregar os livros todos os dias, a escola deveria dar um jeito e solucionar esse "impasse"...
Fechei os olhos de novo seguido de uma respiração bem profunda, pensei num palavrão para gritar como desabafo, mas fui tomado por lembranças de minha época quando estudante também de escola pública e que mal possuía dois livros e ficava invejando os alunos de escola particular quando seus pais gastavam uma quantia considerável só com livros; lembrei também da dificuldade até de tirar cópias das apostilas que o professor solicitava, de como as aulas eram escassas de imagens, de leituras, era basicamente escrever no quadro durante boa parte da aula - ora, o que venho fazendo até hoje! - copiando tudo que estava nele; lembrei também que fazia três ou quatro provas por ano e só havia uma recuperação anual, se perdesse nela, já era, tinha que cursar o ano perdido tudo de novo; se quizesse fazer o vestibular e concorrer com os alunos das escolas particulares, tinha que fazer isso com muita boa vontade, determinação, e sequer sonhar com os cursos mais concorridos, que só os "filhinhos de papai" faziam como medicina e direito... Pois é... Olhei de novo para essa mãe e calei até a alma...
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
Pré-Caju: festa sergipana?
Recentemente aqui no meu estado, mais precisamente na capital Aracaju, aconteceu uma festa que os organizadores intitulam como "a maior prévia carnavalesca do Brasil", o Pré-Caju. Devo admitir que essa festa traz ao nosso diminuto estado uma projeção nacional - ou internacional - e que por sua vez ajuda a propagar nossas belezas, nosso encanto, nossa identidade, nossa sergipanidade ao turista... Espere?! Eu disse "nossa sergipanidade"? Bom, acho que o que de fato tem de sergipano nessa festa é só o nome, "Pré-Caju", porque o resto é de outro estado, de outra cultura. Isto mesmo, a maioria absoluta dos artistas que cantam e tocam seus intrumentos em cima de caminhões de ensurdecimento massivo são baianos! As músicas aqui cantadas são de autoria dos baianos! O sotaque da festa é baiana! E boa parte dos turistas que veem prestigiar esta "grande prévia carnavalesca" também vem da Bahia!
É bom que fique bem claro: não tenho nada contra a Bahia, pelo contrário, até os admiro pela beleza de sua cultura, de sua arte, de sua história, de seu lugar e, sobretudo, pela sua identidade inquestionável e marcante. O que estou criticando são esses mesmos organizadores que creem veementemente que estão divulgando o nosso estado, o estado de Sergipe, com os artistas da Bahia. Ora, imaginem um turista que diz: "fui a Aracaju e vi Ivete Sangalo, vi Chiclete com Banana e etc." "Mas, e de Sergipe? O que você viu nesse Pré-Caju?", perguntaria alguém ao nosso desavisado turista, " O shopping Riomar!?" responderia ele.
Não pretendo aqui levantar uma bandeira em defesa de uma festa do Pré-Caju toda feita por "artistas da terra". Reconheço que não daria o mesmo ibope que as outras atrações, até porque também o ritmo ou o estilo musical, penso, não seria adequado aos nossos artistas que tanto lutam para realmente ter uma autonomia ou uma identidade enquanto artistas sergipanos, mas que isso também não deixaria de ser um desafio para eles. O que questiono é que: como uma festa meramente comercial pode se arvorar a afirmar que faz parte da cultura sergipana?! Difusora da nossa cultura sergipana se ela acontece com a maioria absoluta com artistas de outros estados? Sobretudo da Bahia?
Durante esse período da prévia, artistas baianos dão entrevistas, fazem aparições na mídia o tempo todo e convidam o aracajuano, o sergipano e os demais turistas das demais regiões do país para prestigiarem a festa. E, quando perguntados como se sentem fazendo essa festa aqui em Sergipe, eles respondem sem medo: "estamos em casa! Sergipe é o quintal da Bahia"! Os sergipanos cegos de paixão pelo seu estado esperneiam quando ouvem isso. Acham uma afronta aos nossos costumes, à nossa história, enfim, à nossa cultura. Mas eu pergunto: e esses artistas que afirmam isto estão errados? Ao meu ver, absolutamente que não, pois aqui eles treinam, ensaiam e realmente se sentem em casa, pois sempre são os principais convidados dessa "grande prévia carnavalesca sergipana" que nada tem de Sergipe! É uma festa meramente comercial, de interesses comerciais que não possui nenhuma pretensão de refletir nossa cultura!
Nos dias que antecederam essa "grande prévia carnavalesca" foi notícia aqui no nosso estado um blogueiro que reacendeu uma velha questão que sempre, de algum modo, passa por todo sergipano consciente: é muito dinheiro literalmente despejado nessa festa que enriquece poucos, principalmente os organizadores, que vem do nosso bolso. Pois é. Essa tal "grande prévia carnavalesca", assim correu na mídia, recebe ainda patrocínio e apoio dos governos federal, municipal e estadual, fora as empresas privadas; os organizadores ainda cobram os famosos abadás e seus respectivos blocos destinados para uma parte especial de foliões de boa origem gozando inclusive de segurança particular com os resistentes homens que seguram a corda chamados carinhosamente de "cordeiros"; e, obviamente, os camarotes vips destinados aos foliões que podem gastar pesadas quantias em um espaço restrito cheio de guloseimas e bebidas para simplesmente observar um caminhão de ensurdecimento massivo sendo seguido por uma multidão que acredita piamente que aquela música que está ouvindo é a melhor coisa que um ser humano poderia produzir em termos de canção, mas não pretendo me aprofundar mais nesses assuntos.
É bom que fique bem claro: não tenho nada contra a Bahia, pelo contrário, até os admiro pela beleza de sua cultura, de sua arte, de sua história, de seu lugar e, sobretudo, pela sua identidade inquestionável e marcante. O que estou criticando são esses mesmos organizadores que creem veementemente que estão divulgando o nosso estado, o estado de Sergipe, com os artistas da Bahia. Ora, imaginem um turista que diz: "fui a Aracaju e vi Ivete Sangalo, vi Chiclete com Banana e etc." "Mas, e de Sergipe? O que você viu nesse Pré-Caju?", perguntaria alguém ao nosso desavisado turista, " O shopping Riomar!?" responderia ele.
Não pretendo aqui levantar uma bandeira em defesa de uma festa do Pré-Caju toda feita por "artistas da terra". Reconheço que não daria o mesmo ibope que as outras atrações, até porque também o ritmo ou o estilo musical, penso, não seria adequado aos nossos artistas que tanto lutam para realmente ter uma autonomia ou uma identidade enquanto artistas sergipanos, mas que isso também não deixaria de ser um desafio para eles. O que questiono é que: como uma festa meramente comercial pode se arvorar a afirmar que faz parte da cultura sergipana?! Difusora da nossa cultura sergipana se ela acontece com a maioria absoluta com artistas de outros estados? Sobretudo da Bahia?
Durante esse período da prévia, artistas baianos dão entrevistas, fazem aparições na mídia o tempo todo e convidam o aracajuano, o sergipano e os demais turistas das demais regiões do país para prestigiarem a festa. E, quando perguntados como se sentem fazendo essa festa aqui em Sergipe, eles respondem sem medo: "estamos em casa! Sergipe é o quintal da Bahia"! Os sergipanos cegos de paixão pelo seu estado esperneiam quando ouvem isso. Acham uma afronta aos nossos costumes, à nossa história, enfim, à nossa cultura. Mas eu pergunto: e esses artistas que afirmam isto estão errados? Ao meu ver, absolutamente que não, pois aqui eles treinam, ensaiam e realmente se sentem em casa, pois sempre são os principais convidados dessa "grande prévia carnavalesca sergipana" que nada tem de Sergipe! É uma festa meramente comercial, de interesses comerciais que não possui nenhuma pretensão de refletir nossa cultura!
Nos dias que antecederam essa "grande prévia carnavalesca" foi notícia aqui no nosso estado um blogueiro que reacendeu uma velha questão que sempre, de algum modo, passa por todo sergipano consciente: é muito dinheiro literalmente despejado nessa festa que enriquece poucos, principalmente os organizadores, que vem do nosso bolso. Pois é. Essa tal "grande prévia carnavalesca", assim correu na mídia, recebe ainda patrocínio e apoio dos governos federal, municipal e estadual, fora as empresas privadas; os organizadores ainda cobram os famosos abadás e seus respectivos blocos destinados para uma parte especial de foliões de boa origem gozando inclusive de segurança particular com os resistentes homens que seguram a corda chamados carinhosamente de "cordeiros"; e, obviamente, os camarotes vips destinados aos foliões que podem gastar pesadas quantias em um espaço restrito cheio de guloseimas e bebidas para simplesmente observar um caminhão de ensurdecimento massivo sendo seguido por uma multidão que acredita piamente que aquela música que está ouvindo é a melhor coisa que um ser humano poderia produzir em termos de canção, mas não pretendo me aprofundar mais nesses assuntos.
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