sábado, 11 de setembro de 2010

A Palavra do Senhor

 
Apareceu em minha casa um grupo de evangélicos. Todos muito bem vestidos, bem alinhados. Dois deles, um casal, escolheram-me para propagar o que aprenderam sobre a Bíblia em sua religião e os demais se espalharam que nem pardais em busca de comida pela rua onde moro. Muito simpáticos, dão bom dia e me perguntam se podem perguntar – tão educados... Consinto afirmativamente e aguardo a "pérola" lançada. Óbvio que sou no mínimo suspeito para elogiar alguma religião, sobretudo a cristã, já que minha formação acadêmica desvencilhou-me dos grilhões morais desse fenômeno tão inerente à condição humana. Fora graças à filosofia que consegui libertar-me das amarras para mim agora pseudo-morais e que só me levaram a um estádio de plenitude falseada para não dizer fantasiosa. Mas eis que o casal me questiona se já houvera lido a Bíblia. Como sempre, respondi que não por inteira, mas pelo menos o Novo Testamento tive a oportunidade de lê-lo. Em seguida eles me soltam outra "pérola" ainda mais valiosa que a primeira: - O senhor sabe que o mundo está caminhando para o final? Confesso que fui tomado por certa surpresa ao ouvir da boca de um "crente" tal afirmação tão negativista ou apocalíptica. Novamente consenti que sim, e que inclusive não era de agora que o "mundo está caminhando para o seu final". Empolguei-me. Comecei então a explicar que tal sentimento de destruição ou fim do mundo não vem de agora, mas que era algo que desde a Idade Média já existia. Estava parecendo que eu ia dar uma breve aula aos assustados "crentes" quando de repente eles me interrompem e perguntam se eu queria ser salvo. Fiquei atônito. O que responder para essas pessoas? Que forma de salvação ele estava se referindo? Será que estava evidente que meu espírito decadente suplicava por salvação?... – Basta que o senhor freqüente nossa igreja aos sábados e comece a abrir os seus olhos para Jesus... Não agüentei e rebati: - E porque só a igreja de vocês é que poderá me salvar? Notei que fiz uma pergunta desconcertante. O casal se entreolha, talvez perdidos, até que ela diz: - porque a nossa é a melhor! Essa frase ecoou na minha mente durante meses, anos – é tanto que mais ou menos sete anos depois estou escrevendo sobre ela! – e ainda ecoa. "Porque a nossa é a melhor". Como se a igreja deles fosse um remédio que pudesse ser comprado numa farmácia por uma simples indicação do farmacêutico. A afirmação sem dúvida alguma foi muito profunda. Quer dizer que esse tempo todo da história da humanidade, todas as demais religiões, fora a deles obviamente, estão perdidas ou são "piores", tudo "porque a nossa é a melhor"... Dei um riso sarcástico para os dois e o outro ainda emendou: - o senhor pode começar seu caminho para salvação adquirindo nossa revista por apenas dois reais. Não agüentei. Soltei uma gargalhada e eles tentaram me seguir na risada sem saber ao certo o que estavam rindo...

2 comentários:

  1. kkkkkkkkkkk, tenho tido desses confrontos esse ano mais do que os outros. A galera está em campo meu fío... quanto mais ignorância viceje a televisão, mais ela será o puro retrato da VERDADE, e argumento para os de fraco intelecto.

    É o que se me parece, estudando os preceitos da Comunicação Social, que o mito da caverna de Platão se transmorfoseia para o viés digital. Exemplos:

    Na história do rádio e da tv, houve na igreja quem fosse contrário ao seu uso. Recomendavam aos fiéis que deles se afastassem. Até que com o tempo foram também se transformando em instrumentos do Senhor. Com a internet foi a mesma coisa. Grande mercado alimentado pela ignorância humana esse o da religião.

    Que tal se saíssemos de porta em porta, assim, bem vestidos e alinhados pregando... A NÃO RELIGIÃO???!!!!!!!! Seríamos precursores... e logo depois queimados em praça pública. hehehe.

    Abs, A

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    1. Boa, meu caro Tex!!! Quanto ao seu convite, dependo sumariamente do tempo, kkkkkkkk... Mas a ideia é válida sim. Vamos amadurecê-la.

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